As aranhas habitam todas as regiões do globo terrestre, com exceção do continente antártico. Existem mais de 36 mil espécies de aranhas descritas no mundo, mas, segundo os cientistas, esse número é ainda maior, já que ainda há muitas que não foram descritas. Porém os estudos também mostram que, destas todas, apenas quatro gêneros no mundo todo causam ferimentos graves em pessoas. “O problema é que, dessas quatro, três existem no Brasil e, no caso, em São Paulo”, enfatiza o médico veterinário Cláudio Camacho, que atua na Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI).
Segundo o técnico, a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera os gêneros Latrodectus, Loxosceles e Phoneutria (Araneomorphae) e Atrax (Mygalomorphae) as aranhas que podem causar envenenamento grave no ser humano. O gênero Atrax não é encontrado no Brasil. “Na verdade, todas as aranhas podem causar algum tipo de acidente, mas as consideradas perigosas ou de importância médica no Brasil pertencem apenas aos três primeiros gêneros”, confirma Camacho.
Algumas aranhas podem viver em teias facilmente visíveis, feitas em forma de desenhos geométricos. Elas são encontradas em áreas rurais, normalmente em árvores ou em cantos de paredes. Outras vivem em teias irregulares, emboladas como se fossem novelos de lã, em geral de forma emaranhada. E outras, ainda, não constroem teias e andam nos solos em busca de alimentos. Em geral, aquelas que constroem teias geométricas não representam problema para o ser humano. As que causam maiores acidentes são aquelas que não constroem ou as que constroem emaranhados.
As aranhas podem frequentar e se instalar em variados ambientes como buracos no solo, fendas em barrancos e em troncos de árvores podres, em arbustos e cupinzeiros.Muitas vivem próximo a residências, nos quintais em ambiente peridomiciliar e outras construções urbanas, como tulhas e galpões.
Todas as aranhas são predadoras, carnívoras e se alimentam principalmente de insetos. Espécies de aranhas maiores também podem se alimentar de rãs, roedores, peixes, pequenos lagartos, filhotes de pássaros, outros animais e até outras aranhas, masos insetos são a maior fonte de alimentos das aranhas. “Por isso, elas têm um importante papel no ecossistema, pois têm a função de controlar a população de outros animais, em especial insetos”, frisa o médico veterinário Cláudio Camacho, extensionista da CATI, que completa: “Por outro lado, as aranhas também possuem diversos inimigos naturais como lagartixas, escorpiões, gambás, sapos, rãs e outros animais que as predam como fonte de alimento.
Morfologia das aranhas – o que as diferencia
As aranhas pertencem ao grupo dos artrópodes, que têm como característica principal um exoesqueleto, ou seja, um esqueleto externo o qual se pode sentir ao tocá-las. O exoesqueleto é dividido em duas partes principais: anterior, chamado cefalotórax, onde existem a cabeça, onde ficam as quelíceras (duas agulhas no centro da cabeça), ou seja, os ferrões por onde injetam o veneno quando querem se defender ou atacar, um par de pedipalpos e quatro pares de pernas de cada lado; e na parte traseira fica o abdome, onde estão situadas as fiandeiras, aparelho responsável pela produção de teias.
“O veneno exerce duas funções, sendo utilizado para imobilizar e capturar as suas presas, de forma a se alimentarem, e também como forma de defesa, quando são atacadas por seus inimigos naturais”, explica Camacho.
Aranhas no Brasil e no Estado de São Paulo
Como explicado, existem três principais gêneros/espécies de aranhas que causam problemas no Estado de São Paulo, e são as mesmas que ocorrem em todo Brasil. Pelo nome popular são: a aranha-armadeira (Phoneutria nigriventer), a aranha-marrom do gênero Loxosceles sp; e as viúvas-negras do gênero Latrodectus, a Latrodectus curacaviensis, também conhecida como Flamenguinha, devido às características cores vermelho e preto, e a viúva-marrom (Latrodectus geometricus).
Cláudio Camacho é especialista quando se trata de animais peçonhentos e já abordou, em reportagem anterior, os escorpiões que tanto foram notícia nos últimos tempos pelo aumento de casos, inclusive em áreas urbanas, e conclui: “Em relação à severidade dos casos, no caso levar à morte, as serpentes, mesmo estando em terceiro lugar no número de acidentes no Estado de São Paulo, são as que causam mais óbitos. Os escorpiões lideram os casos de acidentes, porém com baixo índice de óbitos, assim como as aranhas, que também não costumam levar a óbitos, embora os acidentes costumem acontecer com certa frequência”.
Em 2020, segundo dados da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, os escorpiões causaram mais mortes do que as serpentes, devido ao elevado número de acidentes com escorpiões que tem se alastrado nos últimos tempos, inclusive em áreas urbanas.
Acidentes com Animais Peçonhentos no Estado de São Paulo - Ano de 2020
Animais Peçonhentos
|
N.º de acidentes
|
Óbitos
|
Letalidade
|
Serpentes
|
2.127
|
4
|
0,19
|
Escorpiões
|
36.110
|
7
|
0,02
|
Aranhas
|
4.763
|
0
|
0
|
Acidentes com Animais Peçonhentos no Estado de São Paulo - Ano de 2021
Animais Peçonhentos
|
N.º de acidentes
|
Óbitos
|
Letalidade
|
Serpentes
|
1.483
|
5
|
0,34
|
Escorpiões
|
18.907
|
4
|
0,02
|
Aranhas
|
3.000
|
0
|
0
|
A reportagem sobre escorpiões é bem atual, já que ocorrem em tempos quentes e úmidos do verão, e pode ser vista acessando o link https://www.cdrs.sp.gov.br/portal/imprensa/noticia/entre-os-animais-peconhentos--o-escorpiao-e-motivo-de-preocupacao--principalmente-em-periodos-umidos-e-quentes-do-verao
Especificidades – saiba detectar como e qual aranha pode causar acidentes
Cada espécie de aranha tem características próprias, a aranha-armadeira (Phoneutria nigriventer), também conhecida como aranha-das-bananas, é considerada uma das mais agressivas em todo o mundo. “Enquanto outras tentam fugir, essa espécie vai tentar dar um bote, erguendo dois pares de pernas de cada lado, preparando-se para pular e atacar quando se sente ameaçada. Há muitos relatos de acidentes com pessoas que trabalham em bananais vitimadas por esta espécie, a qual acredito ser a que mais tem registro de ocorrências em todas as regiões do Estado de São Paulo”, explica o veterinário.
A aranha-armadeira chega a medir até 15cm na idade adulta. Os seus hábitos são noturnos, é quando elas ficam mais ativas e saem para caçar. Durante o dia, normalmente, se abrigam em bromélias, bananeiras, palmeiras, tocos de árvores, não tecem teias e andam pelo chão à procura de presas para se alimentar. Podem ser encontradas também em áreas urbanas em restos de entulhos e madeiras e até dentro das casas, onde costumam se alojar em locais escuros como sapatos, botas e roupas. Por este motivo, é importante estar atento às residências, em especial nas construções localizadas em áreas rurais, onde os acidentes são mais comuns. Outro fato a ser considerado é que elas ficam mais ativas na época de reprodução, que ocorre nos meses de março e abril.
O veneno da aranha-armadeira é de ação neurotóxica, ou seja, irá afetar o sistema nervoso de animais ou humanos que forem atacados. A dor no local da picada é imediata, rápida e intensa, devendo-se procurar com urgência um serviço de saúde. É importante lembrar que, assim como ocorre com os ataques de escorpiões, os maiores riscos são para crianças, devido ao menor peso corporal. Os acidentes, em 95% dos casos, ocasionam sintomas leves, como edema, dor e sudorese no local; já os acidentes considerados moderados podem causar taquicardia, hipertensão arterial, sudorese generalizada, confusão, vômito e sialorreia (baba); os acidentes graves são raros, podendo causar outros problemas, em especial em crianças, como edema pulmonar e até óbito.
A aranha-marrom (Loxosceles sp.) em uma escala de importância médica é o gênero mais complicado segundo os médicos, pois causa necroses muito intensas. Elas possuem coloração marrom, por isso o nome popular, são pequenas e chegam no máximo a medir 3cm quando adultas. Não são agressivas e os acidentes geralmente ocorrem quando são pressionadas contra o nosso corpo, por exemplo, quando se encontram em roupas, calçados, roupas de cama, entre outros. Elas costumam se esconder em armários, porões, garagens, madeiras e outros locais escuros e seus hábitos também são noturnos. Uma característica é a construção de teias irregulares (não geométricas) e que parecem novelos de algodão. “Um dos graves problemas é que a picada não é dolorosa e não costumam ser percebidas de imediato, por não serem dolorosas, às vezes causam uma pequena coceira e cerca de dois dias depois é que a ferida aparece em forma de halo vermelho, coceira evoluindo para uma ferida e, em seguida, lesões, algumas bem feias, com feridas graves e necroses na pele e que podem até deformar, de acordo com o tamanho”, explica Camacho.
As viúvas-negras (Latrodectus) são de várias espécies, sendo três as mais comuns no Brasil. Apesar de serem bastante conhecidas e o nome inspirar um certo receio; entre as aranhas descritas são as que oferecem menor risco do ponto de vista médico. A viúva-negra de coloração vermelha e preta, devido exatamente a essas cores características, é conhecida como Flamenguinha (Latrodectus curacaviensis); e a outra espécie mais comum é a viúva-marrom (Latrodectus geometricus). Tratam-se de aranhas pequenas, com aproximadamente 3cm de tamanho total, incluindo corpo e pernas; constroem teias irregulares como pequenos novelos e não são agressivas, os acidentes acontecem ao serem pressionadas contra o corpo.
Diferente das outras duas descritas anteriormente, elas têm hábitos diurnos, vivem em arbustos, gramados, em buracos no chão e podem também entrar nas casas e se esconder em armários, roupas de vestimenta e cama. “Geralmente, é aí que acontecem os acidentes, ao vestir uma camisa, casaco ou deitar-se sobre elas”, explica Camacho, reafirmando que é a de menor importância, não existindo registro de óbitos ou acidentes graves. Em geral, a picada é muito dolorosa, pode ocasionar edema, vermelhidão. Não há registros de casos graves no Brasil, apenas acidentes leves, o que a distingue é a dor da picada.
Primeiros socorros nos ataques por aranhas
Independente de ocorrer acidente com qualquer uma destas espécies citadas, deve-se lavar o local com água e sabão, manter o paciente calmo, para não aumentar a circulação sanguínea, e levá-lo imediatamente ao pronto socorro mais próximo, principalmente se for com crianças. “Tomar ou não o soro antiaracnídico irá depender da avaliação do médico e, se possível, deve-se tirar uma foto da aranha ou até leva-la viva ou morta em um vidro, para que seja feito o reconhecimento da espécie e seja aplicado o soro adequado àquela espécie de aranha. E só um médico poderá avaliar se deve ou não aplicar o soro e qual, de acordo com a avaliação clínica do paciente”, salienta Cláudio Camacho.
Prevenir é sempre a melhor ação
Deve-se considerar que as aranhas costumam viver em ambientes peridomiciliar e domiciliar, dessa forma deve-se manter esses locais sempre limpos e arejados. No caso dos ambientes domésticos, manter os armários limpos, verificando periodicamente roupas e sapatos que não são de muito uso. Na área rural, deve ser rotina observar os calçados antes de usar, pois são comuns as picadas nos pés ao se colocarem os sapatos. As camas em áreas rurais não devem ficar encostadas em paredes e nem próximas às cortinas; os berços de crianças devem ficar bem afastados das paredes, o essencial é manter a limpeza e a vigilância de forma rotineira, em especial nessas áreas.
Em áreas de mata, deve-se ter o cuidado de não manusear madeiras e lixos sem uso de luvas, além de se manterem botas nos pés. O mesmo em áreas de cultivo, devem-se usar roupas adequadas ao trabalho no campo. Já no ambiente peridomiciliar, urbano ou rural, os restos de material de construção são abrigos ideais, assim como lixos e armários que não sejam limpos com frequência. “Ou estamos nos ambientes deles, no caso de todos os peçonhentos como aranhas, escorpiões e cobras, ou são eles que entram em ambientes caseiros em busca de esconderijo e alimento, então a prevenção é manter tudo limpo, organizado, sem acúmulo de lixo, caixas, madeiras etc. Quando for roçar a grama, por exemplo, vedar as portas e janelas, para que o manejo e manutenção de um gramado não passe a ser um abrigo para estes animais. A prevenção é: limpeza constante e retirada de todo acúmulo de materiais, para que não seja a própria pessoa a oferecer o local ideal para esses animais se abrigarem e alimentarem”, é o alerta do médico veterinário, que no dia a dia de atendimento aos produtores rurais sempre ouve casos de ataques que poderiam ser evitados.
Graça Moreira D’Auria – Jornalista – Centro de Comunicação Rural (Cecor/CATI/SAA) – mgdauria@sp.gov.br e cecor@sp.gov.br